Quando eu disse aos colegas e amigos que mestraram para mim que eu estava escrevendo uma campanha para mestrar a longo prazo, eu sempre ouvi a mesma coisa:
"Não importa quão elaborada seja a história, se você não conhecer bem como os seus jogadores pensão, ela não vai dar certo."
Isso ficou batendo na minha cabeça quando eu crie Valgranada e outros universos que eu nunca usei. Começar simples e ir dando complexidade às histórias conforme eu fosse conhecendo os jogadores. Eu estou adorando mestrar Valgranada para os amigos que só conheci graças a esse forum, mas um evento recento me fez refletir sobre essa dica, e como ela é boa. Esse evento me fez refletir sobre o assunto pelo qual você deve ter clicado nesse post: A Liberdade para Discutir Assuntos "Sensiveis" nos jogos de RPG.
Um pouco de contexto. Meu jogo é composto por 6 jogadores, sendo 4 rapazes e duas moças. Os rapazes são dois adolescentes do ensino medio, um jovem adulto (19) e um adulto (24); as moças são uma adolescente e uma adulta (28, a mãezona do grupo). Ambas as jogadoras tem espirito de liderança e escolheram classes de conjuração (maga e feiticeira). Elas colocaram nos seus backstorys e personalidades pontos que me fizeram pensar que elas tinham passado ou testemunhado situações de sexismo e abuso, se sim ou se não, não importa, eu não perguntei. E o simples fato delas serem mulheres faz com que a resposta seja: Provalvelmente. Eu me ofereci inicialmente para ser um canal seguro de compartilhar dores para todos os jogadores, mas ninguem falou. Então chegamos ao jogo.
O grupo estava saindo de uma cidade pequena onde realizaram uma side quest pouco importante e estavam seguindo para uma metropole onde realizariam a missão principal. No meio do caminho eles encontram um culto intinerante pacifista de uma deusa da vida. O que esse culto faz? Cultuam um demonio? Um deus maligno? NÃO!!! Eles simplesmente servem uma deusa da vida muito respeitada, sendo que discordando de certas formas de instituição da religião maior. A Questão "Sensivel", qual seria. O culto é liderado por um suposto sumo sacerdote que manipula os textos sagrados para ter liberdade e impunidade de abusar sexualmente das mais jovens do culto.
Quando eu criei essa trama eu não estava tentando dizer nada. Eu me considero feminista e não preciso falar isso aos quatro ventos. Quando eu criei essa trama eu estava pensando: "Minhas jogadoras vão amar esse plot, podendo considerar isso uma vingança, mesmo que uma de fantasia, por todo genero feminino." E eu estava certo. Elas adoraram ver que nem todos do culto eram alienados pelas fraudes do sumo sacerdote e que havia uma maioria que considerava essas supostas santas leis erradas (mesmo que as realizando). Mas (pois sempre há um mais), eu errei feio ao tratar tal assunto de forma minimamente desrespeitosa.
Ao fim de cada jogo eu peço meia hora de criticas, para que meus jogadores possam dizer o que eu devo trazer mais e o que eu devo evitar nas proximas sessões. Todo DM deveria fazer isso. Todos gostaram da minha narrativa, mas uma das jogadoras me enviou uma mensagem no privado, pedindo para que se ouvesse outra aventura desse teor eu avisasse antes para que ela controlasse gatilhos de raiva. Foi ai que a ficha caiu.
E se uma delas tivesse realmente passado por tal situação. Sera que ao invez de um gatilho de raiva não despertaria um gatilho de panico? Trauma? Elas podem até ter gostado da história que eu narrei, elas podem até não ter passado por tais situações, mas eu sinto que as tratei com desrespeito e machismo, mesmo sem querer soar dessa forma. Eu as conheci bem o suficiente como jogadoras para saber que elas adoraram usar seus personagens fantasiosos para se vingar, mas não as conheci bem como mulheres para entender que tratar tal assunto com tanta naturalidade pode ser prejudicial.
Então fica a pergunta: Como ou quando tratar de assuntos sensiveis? Vamos primeiro diferenciar. Um assunto Tabu de um assunto Sensivel. Assuntos Tabu precisam ser tratados, por que no final eles são bestas. Assuntos tabu seriam homossexualidade, transgenero, manipulação religiosa, liberdade de expressão, xenofobia e etc. Assuntos sensiveis são mais complicados de lidar, são estupro, abuso de qualquer tipo, violencia especificada (racismo e homofobia) e etc. Quando for tratar de assuntos que podem ferir de forma especifica um ou mais jogadores, pergunte com antecedencia se aqueles que se sentiriam ofendidos ou machucados por tal assunto se sentem confortaveis em trata-los e o por quê de sua resposta. Depois pergunte ao resto do grupo se é ok e por quê. Lembrando que os jogadores que tem sensibilidade ao assunto o voto deles conta mais que todos os outros juntos.
No RPG se deve ter liberdade para tratar das melhores e piores histórias, mas deve ser tambem um ambiente de refugio aos jogadores. Vamos jogar, mas com respeito.
Oi Breno. É um assunto importante que você trouxe. Acredito que um RPG pode abordar qualquer assunto, dentro do limite do razoável. Em cenários adultos ou dark fantasy, vale conversar antes com o grupo para deixar claro que alguns (e quais) assuntos sensíveis serão abordados. Circula por aí um formulário que os jogadores podem preencher com estes assuntos. Isso é importante para informar o(a) DM antes do jogo começar. Se eu encontrar uma versão PT-Br desse formulário, eu vou postar abaixo do meu comentários.
abs